Braille.
Passei a mão nas costas de um homem ontem. Senti os seus altos e baixos. Li-o em braille, mas tudo aquilo que transpareceu foram pontos de interrogação. Serei eu que lhos dou ou será que já vinham com ele, incrustados na pele, por baixo do tecido sedoso de palavras que o encobria, aquando a sua primeira aparição? Também sinto reticências, de coisas por dizer. Não sei, assusta-me. Pontos de interrogação e reticências são a minha pontuação. Não combinam nos meus outros enquanto a suporto, porque eu sei que é a minha pontuação e apesar de interpretações alheias, reconheço o verdadeiro significado das minhas reticências e interrogações, enquanto as converto para pontos finais e exclamações. No entanto, as dele distraem-me dessa conversão. Tento descobrir o seu significado nos últimos tempos, sabendo que isso me cansa o espírito por tender a esticá-lo além de si mesmo, mas parecem-me pontuações em branco. Algumas exclamações inesperadas e passivas surgem, com frequência tendencialmente crescente, proporcional ao quanto mais lhe passo a mão pelas costas. Meu ser não lida bem com grandes frequências; nem cardíacas, nem relativas, nem respiratórias, nem acumuladas. Só lido bem com poesias e subtilezas, pequenas loucuras aleatórias, inspirações encontradas no canto da sala, vibrações de um lugar pulsante enquanto ordeiro, olhares que resumem os maiores romances num momento apenas, porque basta um momento ocasional para me dar certezas. Quando acabar as costas deste homem, terei encontrado histórias e relatos como não mais vou conhecer; mas, nessa região lombar, minhas mãos irão ler uma das duas opções: volta ao início ou fim.
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